A lista de bons motivos para procurar um ambiente com bastante natureza por alguns dias de folga é infinita. Porém, é também extensa a quantidade de cuidados necessários ao se aventurar no turismo de imersão em ambientes mais rústicos.
“A natureza não é playground”, alerta o agente de turismo Diego Lopes de Abreu, especialista em trilhas pelo Ceará. Acidentes como o desabamento de pedras em um cânion no lago de Furnas, em Capitólio (MG), sinaliza uma série de alertas necessários para que o sonho de uma conexão com a natureza não se torne uma trágica história.
“Antes de mais nada, deve ser de responsabilidade dos governantes locais ou da entidade privada responsável [caso haja concessão], monitorar o risco para atividade turística constantemente, e não transferir toda a responsabilidade para os guias ou o turista em si”, reforça a bióloga e paleontóloga Aline Marcele Ghilardi, professora e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
De toda forma, é essencial que o visitante conheça os meios para minimizar as possibilidades de um acidente, bem como para que não prejudique a dinâmica da fauna e da flora locais.
Experiente em roteiros por trilhas e viagens mais desafiadoras, o professor cearense Fabrício Leomar Lima chegou a ser conhecido como “listinha” pelas listas que fazia antes de iniciar “uma trip” para não se esquecer de nada.
Entre os itens essenciais que leva em qualquer empreitada estão kit de primeiros socorros, medicamentos, lanterna, canivete, corda de cinco metros e fósforo ou isqueiro.
Além disso, com a experiência de quem se aventura desde 2004, o professor reforça ser preciso “pesquisar as condições climáticas e analisar dia a dia para ver se é mais seguro fazer alterações”.
Temporada chuvosa
A preocupação de Leomar está alinhada com as orientações do geólogo Tito Aureliano Neto, doutorando pesquisador na Unicamp. “Se o turista perceber um tempo chuvoso há muitos dias, deve-se evitar trilhar por rios, encostas, rochedos, e cachoeiras”, orienta Neto, que também é paleontólogo.
O período chuvoso costuma ser o favorito para quem busca encontrar cachoeiras com um grande volume d’água, pois proporcionam um espetáculo natural. Mas é também a época de mais atenção para turistas e guias, pois as consequências das nuvens carregadas no céu podem impactar até mesmo quando a chuva não cai diretamente no local a ser visitado.
“Basta chover forte em alguma região acima ou à montante do rio, para inesperadamente um grande volume de água atingir a cachoeira. Isso pode arrastar turistas e também trazer uma grande quantidade de detritos como troncos, galhos, rochas etc., que podem feri-los ao ser arremessados das quedas d’água”, orienta a professora Aline.
Agente de viagens e morador há 12 anos da Chapada Diamantina (BA), famosa pelas exuberantes cachoeiras, Marcelo Cabral reforça as orientações dadas por Aline.
“Existem riscos que são inerentes a qualquer fator humano. Pelo próprio processo de erosão, qualquer pedra na Chapada Diamantina ou em qualquer chapada dessa pode vir a desabar sem aviso prévio.
Por isso, seguir guias experientes e que conheçam bem a região é fundamental”, reforça.
Com a experiência de cursos de sobrevivência na selva antes de se tornar guia pelas trilhas cearenses, Diego recomenda que seja feito um trabalho em equipe. “Além de guia, é importante ter um socorrista no grupo e uma pessoa no suporte, posicionando alguém mais a cima que pode entrar em contato via rádio para avisar alguma eventualidade.”
Responsabilidade coletiva
A conduta, porém, não é só do guia, ela precisa ser coletiva. E isso inclui consciência ambiental. “Quem é guia sempre precisa fazer um trabalho de conscientização para que as turmas não consumam bebidas alcoólicas, cigarro e entorpecentes. Até conversas paralelas muito altas podem prejudicar o andamento da trilha”, comenta Cabral.
Optar por ouvir a música favorita enquanto aprecia a natureza pode, inclusive, prejudicar a contemplação. “Quando turistas buscam passeio na natureza, é de se esperar que queiram ver aves, peixes e outros animais selvagens. Mas acabam afastando tudo com todo o ruído, muitas vezes por falta de informação”, relata o geólogo Tito.
Mesmo que você seja do tipo de viajante mais consciente e esteja em busca de uma conexão total com a terra e muito pé no chão, também não escapa da obrigação de ficar atento aos equipamentos ideais antes de sair por aí desbravando solos desconhecidos.
E isso inclui, principalmente, o que você está pisando.
“Tênis de corrida, por exemplo, costumam ter um solado mais liso, completamento oposto do que se recomenda para terrenos acidentados”, alerta o guia cearense Diego. Um simples escorregão pode causar uma torção capaz de gerar um resgate até mesmo com maca improvisada.
Equipamento adequado: check! Caixinha de som desligada: check! Atenção às condições climáticas: check! Só falta a coragem para desbravar o desconhecido.
Mas, atenção: tão importante quanto bravura é a cautela. Ser o mais valente da turma nem sempre é vantagem quando se trata de turismo de aventura.
“Ao turista, se algo lhe parece arriscado, provavelmente é”, comenta a pesquisadora Aline Ghilardi. “O medo adiciona prudência e a prudência também ajuda a evitar acidentes”.
A conduta é reforçada pela experiência do professor Leomar. “Você não precisa fazer algo só porque outra pessoa fez e o desafiou.”
Portanto, antes de pisar qualquer área ambiental e assim conseguir uma experiência com o máximo de segurança possível, vale lembrar do lema do viajante: respeitar os espaços da natureza e seus próprios limites.