Tenho certeza de que o Neighbours, um café com o melhor bolo de banana do mundo, situado bem embaixo do lugar onde fico sempre, fechou. De que a Maison Plisson agora tem um quiosque chamado Petit Plisson, no jardim das Tulherias, pois vi isso no seu site. De que o Samaritaine reabriu e é visita obrigatória mesmo para quem não quiser comprar nada por causa desse câmbio surreal.
Sei também que a mais incrível retrospectiva de Baselitz está em cartaz no Beaubourg. Que Damien Hirst é inesperadamente a estrela da temporada na Fundação Cartier. E que o Museu do Quai Branly não está mostrando nada de extraordinário, mas que, mesmo assim, eu vou querer reencontrar seu acervo.
Sim, estou me preparando para ir para Paris, quase dois anos depois de minha última visita por lá. Não estou com muito tempo livre para planejar os dias na capital francesa e estou achando isso até bom!
Claro que estou preocupado com duas coisas: a possibilidade de o turismo se fechar novamente por causa da quarta (quinta?) onda de Covid-19 na Europa; e, caso eu consiga viajar mesmo, qual liberdade terei para circular e visitar os lugares que gosto de ir na cidade.
Mas, acima de tudo, estou excitado com a possibilidade de voltar ao destino ao qual eu já viajei mais vezes fora do Brasil. Depois de tanto tempo…
Estou preparado para encontrar um cidade diferente. Por relatos de amigos, brasileiros e franceses, que passaram o período brabo da pandemia por lá, Paris está ligeiramente mais dura. Ou, ainda, os parisienses estão ligeiramente mais desconfiados.
Não, eu não sou daqueles que acham que os franceses não gostam de estrangeiros. É das grandes capitais arrastar pelas ruas uma certa empáfia. Pense em Nova York, Londres, Roma, ou até mesmo São Paulo. Mas não há barreiras quando você aborda o parisiense de uma forma simpática.
Talvez um dia eu ainda pague a língua por essa benevolência toda com Paris. Mas esse contato é o que menos me preocupa nesse retorno tardio.
Há meses sonho com essa visita e, ao mesmo tempo, tento administrar a ansiedade. Quando alguém me perguntava qual era o primeiro lugar internacional que eu queria visitar depois que o pior tivesse passado, eu dizia Bangcoc. Mas era mais por reflexo.
A capital da Tailândia sempre é o lugar que eu mais quero ir, por razões que, se um dia eu compreendê-las, prometo escrever uma coluna sobre isso. Mas Paris é a paixão, são as memórias, os amores, coisa simples assim.
Que fique claro, esta é uma das cidades mais sofisticadas do mundo. Mas talvez justamente por isso a ideia de que ela é capaz de oferecer prazeres descomplicados escapa a muitos turistas que nela transitam.
Alguns deles já descrevi aqui: uma declaração de amor com a Torre Eiffel cintilando à meia-noite no inverno; um restaurante maravilhoso onde uma faca velha segurava a janela no vento forte; um passeio de carro à noite pela Champs-Élysées com uma tia querida.
No entanto, há muito outros que, de tão tolos, duvido que chamem sua atenção: a tradição de ver um filme ruim no dia 1º de janeiro (prometo retomar!); os flertes na feira do Boulevard Richard Lenoir; um anel comprado na Agnès B.; uma “La Bohème” espacial na Ópera da Bastilha; uma janela no Boulevard Beaumarchais.
E mais: aqueles que ainda vou colecionar quando aterrissar por lá dia 17 de dezembro.
Tudo isso vai fazer parte dessa paixão que me confunde, me embriaga, me inspira e me acalma. E que, 23 meses depois, tardia, muito tardiamente, eu vou reencontrar. Será?
Fonte: Folhapress / Zeca Camargo
Jornalista e apresentador, autor de “A Fantástica Volta ao Mundo”.